Marketing Existencial é, além do título da obra, o eixo filosófico abordado por Luiz Felipe Pondé em seu último livro.
Você pode estar se perguntando. Que propriedade teria um filósofo para falar sobre marketing? Já na contracapa Pondé avisa ao leitor que o livro NÃO é sobre marketing. É sobre a Existência. Mas o aviso é desnecessário, pois há um rico material que indica caminhos para o mercado e que permite a um empreendedor entender o chamado “consumidor de significados”. Indiquei a leitura para amigos e colegas e só ouvi elogios.
Neste artigo sobre o marketing existencial eu me aventuro, sob a ótica do empreendedorismo, a cruzar as informações de mercado com a leitura filosófica sobre o impacto das dores da alma no marketing.
As dúvidas em relação à existência.
O mundo em que vivemos é cheio de oportunidades. Ainda assim, a angústia, a agonia e a solidão esmagam o Homem contra a indiferença do mundo “científico e calculado”. Nossa alma é provocada pela angústia. Nos percebermos neste mundo livres para sermos o que quisermos ser.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima que, atualmente, mais de 300 milhões de pessoas de todas as idades sofrem com depressão em todo o mundo. O órgão alertou ainda que a depressão figura como a principal causa de incapacidade laboral no planeta.
O Homo sapiens, até onde sabemos, é a única espécie que necessita de significado tanto quanto necessita de ar, água e comida. Mesmo agora, andando em carros inteligentes e usando smart phones, continuamos na mesma condição de nossos ancestrais: nada sabemos sobre o motivo de estarmos aqui.
O Self consumidor narcísico.
Todos nós somos consumidores de significados. Somos consumidores de bens invisíveis que têm relação com o mercado afetivo, profissional e espiritual. Somos consumidores com comportamento centrado na ideia de otimização do bem-estar (físico, social, psíquico, espiritual…) e na consequente eliminação do mal-estar. Quantos de nós buscamos a “qualidade de vida”?
Significado é o link entre a existência humana e o consumo no século XXI. Bens invisíveis e bens de significado (e produtos de significado) são a mesma coisa. Um exemplo dessa afirmação seria uma viagem para um lugar remoto. Ela poderia ter como objetivo a busca interior. A passagem poderia ser considerada como um produto, mas o bem invisível aqui seria “a busca interior que dá a sensação de sentido a vida”.
A cultura do narcisismo é um fenômeno de sociedades liberais e enriquecidas. É uma cultura com forte caráter terapêutico, com valores subjetivos, com pavor do envelhecimento e do sofrimento e com sentimento crescente de isolamento. Isso cria a necessidade de conexão com produtos que compensam essa ausência de vínculos.
Com minha visão de empreendedor, já vislumbro aí um nicho de mercado: alta dependência dos produtos de significado que estanquem o sentimento de isolamento e insegurança.
O narcísico tende a ser workaholic. À medida que ele se sente “mais em casa” com uma marca do que com a família, sua busca de sentido terá um novo parceiro “confiável”, o branding existencial.
Provocação: para quem leu “Organizações Exponenciais”, o parágrafo acima já deve estar fazendo uma relação com o Propósito Transformador Massivo (PTM). São as declarações “inspiradoras” das novas empresas. As mensagens têm como objetivo capturar os corações e mentes – também as imaginações e as ambições das pessoas – dentro e, principalmente, fora da organização.
Exemplos de declarações de organizações exponenciais:
- X Prize Foundation: “Promover avanços radicais para o benefício da humanidade”.
- Quirky: “Tornar a invenção acessível”.
- Singularity University: “Impactar positivamente um bilhão de pessoas”.
Será mais fácil contratar um millenium se sua empresa possuir um “significado existencial” na declaração?
O consumidor de significados é consciente do futuro. Ele está saturado de informações, de riqueza material e está obcecado pela própria segurança material. Focado em sua saúde física, mental e espiritual, esse self consumidor recusará qualquer oferta que não levar em conta seu anseio de bem-estar.
Marketing Existencial como psicologia do futuro.
O autor defende que o Marketing Existencial será, em larga escala, parte da psicologia do futuro. Não substituirá outras formas de psicologia, mas será a mais acessível para o consumidor ágil, capaz de viver à base de aplicativos que entregam bens invisíveis.
Essa aposta do Pondé me lembrou do aplicativo Tysdo, lançado em 2013 por Roberta Vasconcellos, agora CEO da BeerOrCoffee. O app incentivava as pessoas a compartilhar os desejos reprimidos pela correria do dia a dia. A lista de desejos poderia incluir coisas como praticar um esporte, comprar um carro, aprender a cozinhar ou escalar o Everest.
Outro exemplo é a plataforma de viagens com propósito Work Nomads. Criada pela brasileira Amanda Barbosa, a plataforma possibilita ao viajante trocar trabalho voluntário por hospedagem. As pessoas estão descobrindo uma forma mais barata de viajar e que tenha um propósito.
“Work exchange (trocar trabalho voluntário por hospedagem) é uma ótima maneira de entrar em contato com o nosso propósito. Essa oportunidade leva o viajante a conhecer mais de si mesmo. E nós precisávamos de uma plataforma que falasse a nossa língua, com os nossos lugares. Viagem de work exchange é uma viagem de transformação. Cada experiência é única”. Amanda Barbosa.
O marketing existencial ampliará o mercado dessas opções, tornando o homem e a mulher mais assertivos na busca pela felicidade (ou na ausência da dor).
O neuromarketing.
O autor não chega a abordar o neuromarketing, mas seria impossível não fazer essa combinação com sua visão. Segundo Pondé, “como o marketing é uma ciência que identifica, organiza e produz necessidades e desejos, ele borra as fronteiras entre o que seria o mundo real de nossas necessidades e desejos e o mundo em que ele cria essas necessidades e desejos”.
Neuromarketing é a união do marketing com a ciência. O neuromarketing procura entender melhor o comportamento do consumidor. Os estudos iniciaram em grandes universidades e utilizam diversos exames, como aparelhos de ressonância, eye-tracking e pupilometria para observar a reação das pessoas aos estímulos de propagandas. Isso mede as reações inconscientes do corpo e traduzem aos profissionais de marketing o funcionamento do seu cérebro durante a experiência de consumo.
Mas afinal, isso será usado a seu favor ou a favor da indústria?
Provocação: Sean Parker, criador do Napster e financiador do Facebook, se tornou uma espécie de arrependido das redes sociais. Ele alega que o Facebook foi criado para consumir o máximo possível de atenção consciente dos usuários, explorando uma vulnerabilidade na psicologia humana. “Os inventores entendiam isso conscientemente. E fizemos mesmo assim.” Leia aqui a íntegra da matéria.
Eu reforço. Leia o livro Marketing existencial!
Tentei ao máximo não fazer do artigo um spoiler do livro. Para quem gosta ou não de filosofia, eu recomendo fortemente a leitura. O autor mergulha nos estágios da existência – estético, ético e espiritual – e descreve diversos exemplos.
Você entenderá como o marketing pode tornar-se um especialista no desespero contemporâneo. Na sua estratégia de negócios, você será mais profundo no planejamento e na concepção da linha de produtos. Ou seja, você será capaz de criar significados mais “duradouros” e raros para o seu cliente.
O marketing será a ciência social aplicada mais importante do século XXI! Pense nisso…
Respostas de 4
Ótimo artigo! Fiquei curiosa para conhecer o livro.
O livro problematiza exatamente essa questão da procura infinita por significados – que sempre esbarra em uma nova angústia. Não é possível estancar o sentimento de isolamento e insegurança; isso somente nos torna adultos infantilizados. Explorar isso para o marketing não é oportunidade, é oportunismo sujo.
Olá Lavínia, tudo bem? Não concordo em utilizar esta vulnerabilidade, também considero oportunismo. O Pondé também considera isso um oportunismo.
Ótimo artigo.., parabéns
deu vontade de conhecer o livro